Nesta quarta-feira, as muitas horas de transmissão televisiva da etapa 5 da Volta a Espanha foram preenchidas por boa conversa sobre João Almeida, Primoz Roglic, as dinâmicas internas da Emirates e as probabilidades de vitória de vários ciclistas. E fez sentido que assim fosse.
Analisar uma etapa de uma prova de ciclismo com base nas conversas da transmissão televisiva não é uma doutrina jornalística especialmente elogiável, mas, por vezes, pode ajudar. E se foi isto que ocupou os comentadores é porque na estrada nada se passava – e também, convenhamos, porque o assunto Almeida estava “fresquinho” e era bastante rico.
E houve ciclismo? Mais ou menos. Durante 139 quilómetros, não houve muito. Vimos um pelotão a rolar atrás de dois aventureiros, sempre bem controlados, sobrevivendo a temperaturas entre os 35 e os 40 graus.
Já em Sevilha, depois de uma queda que levou Rui Costa ao chão – o português abandonou a prova –, houve cerca de quatro quilómetros de uma longa avenida sevilhana, como há muitas, com vitória de Pavel Bittner (DSM) numa chegada ao corrida. Bateu Wout van Aert por muito pouco, numa chegada na qual Kaden Groves, o terceiro, voltou a ser “enganado”.
Apesar de ser o velocista mais forte em prova e de ter claramente o melhor comboio, Groves não aproveitou o bom trabalho da Alpecin e deixou-se novamente antecipar – olhou para a direita à procura de Van Aert e o belga, que seguia na sua roda, passou pela esquerda.
Atrás de ambos vinha Bittner, que foi quem teve a melhor ponta final e venceu pela primeira vez numa “grande volta”.
Fuga condenada
Sem a vitória de Bittner e o abandono de Rui Costa há pouco para contar da etapa. Sejamos claros: quando Ibon Ruiz e Txomin Juaristi decidiram “ser amigos”, logo no primeiro quilómetro, todos sabiam que era muito pouco provável que viessem a celebrar juntos no final.
Durante a etapa, os directores da Kern Pharma e da Euskaltel, mesmo que não ignorassem os seus aventureiros, até falavam mais das opções que também tinham para final em corrida do que da grande aposta no sucesso dos seus fugitivos. Por aqui estava tudo dito.
E foram, como todos esperavam, apanhados a 38 quilómetros do final, apesar de terem chegado a rolar mais de cinco minutos à frente do pelotão.
E se a etapa não tinha muito de interessante isso também se devia ao calor tórrido na Andaluzia. Luis Ángel Maté, experiente ciclista espanhol, dizia antes da etapa que correr a Vuelta durante a tarde, e em Agosto, não deveria continuar a ser algo visto como ideia vencedora. “É um debate que tem de ser feito. Mudar os horários, mudar a altura do ano, não sei. Sair às 12h nestas horas de calor? Vamos ter de abordar este assunto”, apontou. E este seria um bom debate para se ter, porque o desporto sofre com isso.
Para esta quinta-feira está desenhada uma etapa montanhosa, mas sem final em alto. Há uma subida de primeira categoria e três de terceira, um perfil que dá boa probabilidade de sucesso a uma fuga – dificilmente os principais favoritos vão desgastar-se num dia destes, até pelo calor que existirá, a não ser que algum ciclista perigoso se coloque na fuga. A Emirates tem várias cartas para jogar em dias destes, mas não é provável que assim seja, até porque a “truta” que for para a fuga será odiada por muita gente.